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Libertango

Libertango, ou: O Poema Debruçado Sobre um Corpo
(Para ser lido ao som de “Libertango”,
do compositor argentino Astor Piazzolla
— um experimento sinestésico...)


poema de Ivan Pereira Santos Júnior 
Neli Vieira - fotoinipoesia


Este poema vem desnudar e absolver.
Tão livre, tão livre!
Que mistério!...
Eu quero um corpo para viver.
Eu quero um corpo para livrar, livrando-me em luz.
Eu quero um corpo para dissipar a solidão
         [e ser mais sólido!
Eu quero, portanto, penso!
Eu quero a honra de um corpo em transe.
Eu quero um tango, uma tragédia, uma comédia
         [e um grande amor.
Eu quero um corpo para destrancar-me as vãs carências.
Eu quero um corpo que, de tão solar, me cegue de paixão
         [e morte.
Eu quero a sorte em solidão temível.
Eu quero uma liberdade livre de presságios
         [em mulher à noite.
Eu quero dizer, sem palavra alguma.
Eu quero amar sem tormenta alguma.
Eu quero a amiga sem tristeza alguma,
         [que me ama a liberdade!
Eu quero um corpo, onde não me atrevo, e sonho.
Eu quero que, de tanta orgia, eu morra.
Eu quero, em trevas, um cenário em luz.
Eu quero a cruz de uma mulher em torno.
Eu quero o ninho da lascívia em fêmea.
Eu quero um corpo sem arrependimento,
         [envolto em dádiva ou favor.
Eu quero um corpo sofrido e, amanhã, alçado em luz.
Eu quero um corpo e romper o silêncio noturno.
Eu quero um corpo para um amor trágico,
         [em transe e fogo.
Eu quero um corpo branco e negro para beijar
         [nas trevas da noite.
(Eu quero a noite.)
Eu quero, sem desdobramento ou cólera.
(Nunca amei tanto o vermelho dos semáforos,
         [que posso parar para escrever.)
Eu quero a vivência, um corpo e existência; eu quero
         [o tango para libertar-me.
(Libertango!)
Eu quero a concupiscência da mulher que se entrega
         [e destemor.
Eu quero o ardor de silêncios mortos.
Eu quero um corpo em traje de sangue.
Eu quero todas experiências possíveis,
         [que me empolga um corpo.
Eu quero o frêmito doentio do sonho.
Eu quero moinhos para combater — em nome de um corpo.
Eu quero a sinfonia dos desejos impuros.
Eu quero não perder tempo com nada.
Eu quero um corpo para nele inscrever
         [o poema.
Eu quero o corpo que me ame, sem se importar com
         [amor perfeito ou redenção.
Eu quero o corpo que me chame.
Eu quero a chama que entorpece e dança.
Eu quero a ânsia de um puro corpo, e breve.
Eu quero o corpo que me estanque o tempo.
Eu quero o vento para a soledade.
Eu quero liberdade, sem claudicar no extremo.
Eu quero, e tremo, e quero, e compreendo.
Eu quero a tragédia de um tango e dor.
Eu quero a comédia da vida e calor.
Eu quero — e estou farto! — um corpo que baile.
Eu quero um corpo que dance no abismo.
Eu quero a chama que me inflama e esquece.
Eu quero um corpo em traje de algo.
Eu quero um corpo que se não compra.
Eu quero um corpo que me abrace e vá.
Eu quero um corpo, e dar vida a um corpo.
(Não quero hipócritas em meu velório!)
Eu quero um corpo para amar, somente.
Eu quero um corpo em cores e vida.
Eu quero um corpo para rir dentro dele.
Eu quero o trágico, eu quero o sátiro.
Eu quero o trânsito entre o apolíneo e o dinisíaco.
Eu quero a flor de um corpo sobre o leito.
Eu quero o deleite da chama sem pecado.
Eu quero um corpo, o certo e o errado.
Eu quero viver...
Eu quero vida!

Agarro-te!!!


Santos, 25/05/2010
Ivan Pereira Santos Junior

Comentários

Anônimo disse…
Muito bem!
Se é recomendado para que seja lido ao som do Libertango, e a música eu tenho, falta-me o livro!
Bom ano para vocês!
Silvia Crusco
silviacrusco@terra.com.br

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