- Tarde, seo Warte!
- Tarde!
- Bão?
- Bão!! E ocê?
- Uai, bão, tamém!
- Seo Warte, põe um gole daquela margosa aí pra nóis!
- Hum... Da branca ou da Amarela, Nerso?
- Pó pô da amarela, que é pra amaciá o estrâmo. Ô seo Warte?
- Fala, home!
- E as venda, tá boa?
- Tá boa? Taboa é o que dá no brejo, sô! Por que que ocê tá perguntâno?
- Uai vóooooorta! Que bicho picô o senhor, seo Warte?
- Bicho-calotêro! Já ouviu falá??
- Desse nunca vi não, uai! É brabo?
- Brabo nada! É manso, o desgramado!
- E é feio, o tar?
- Bota feio nisso, estrupício! É cabeçudo, zoiúdo e dentuço!
- Uai, credo! Tem inté dente?
- Uns três, só! Iguar ocê memo, Nerso!
- Credo, seo Warte! O senhor tá disdenhâno eu, uai?!
- Tô não, Nerso! É só pra vê se o ocê alembra darguma coisa... Alembrô não?
- Uai... Parece que não! Nossa! É num é que alembrei memo! Pega um cadim desse torrêmo, que tá durmido aí na estrufa, pra móde acompanhá a pinga, uai! Tava inté esquecêno, sô! Se num é o senhor pra alembrá eu...
- Que mané torrêmo, estrupício?! Tô falâno de tira-gosto não; é da continha que o senhor esqueceu de pagá, já faz uns par de mês. Alembra não?
- continha? Ahhhhhh, a continha! Uma continha, pequeninica, né?
- Era pequena, há uns dois meses atrás; agora é conta, conta grande! Já encheu uns par de caderneta!
- Uai, sô Warte, então o trem tá feio memo?! Mas... óiqui, eu vim aqui pra falá disso mêmo com o senhor: sabe a Carminha, minha patroa?
- Lá vem lorota... O que tem a dona Carminha, Nerso? Tá doente? Ha
- Credo em cruz, seo Warte! Bate na boca! A Carminha tá um coco, com a graça de Deus!
- O que que tem ela, então, estrupício? Desembucha!
- É que ela foi na farmácia, lá na cidade, pra comprá tinta, pra móde debreiá os branco dos cacho. Senhor sabe muié, como é que é, né, seo Warte?
- Sei. Mas e aí, Nerso? Num me enrrola não, home! E a conta?
- Ô home apressado, sô! Carma! O senhor num deixa nem eu cabá de contá, uai! Aí... Mas o quê que eu tava falano mêmo?
- Ocê tava contâno do cabelo da dona Carminha, Nerso!
- Verdade! Então, a vizinha lá de casa, muié do seo Chico Farinha, conhece ela, seo Warte?
- Dona Genoveva dos Pão. Que que tem ela? Fala logo, Nerso!
- Falo. A dona Veva falô pra Carminha comprá uma tinta com cor de caju...
- É acaju, mudão!
- Então! Que foi que eu falei? Cajú, uai! O pobrema é que o rapaz da farmácia errô nos tom da tinta: em veis de vermeiá, o trem abrobô!
- Abobrô?! Como assim, estrupício?
- Abrobô abrobano, uai! Cor-de-abróba! Nunca viu abróba que cor que é?
- Ah... cor-de-abóbora... entendi. E daí? E a conta, Nerso?
- Carma, seo Warte! Eu exprico. Eu tinha pedido pra muié vim, inté aqui, pra móde pagá o senhor, mas, dispois que ela saiu do banheiro, e eu vi aquela cabeça cor-de-abróba, eu pensei: como é que eu vô mandá a Carminha na venda, desse jeito, nessa feiúra. Tá pareceno bastião de folia de reis! Que vergonha do Warte!
- Hum... Sei. Então porque que ocê mesmo num veio prá pagá a conta?
- Ara! Que jeito?! Eu tive que disinterá o dinhêro! Senhor credita numa coisa dessa? Tive que mandá a Carminha lá na cidade, de novo, no salão da dona Durce, pra podê desabrobá aqueles cacho tudo. Mas valeu a pena: ficô uma belezura! Dá inté gosto de vê! O senhor entende, né, seo Warte?
- Entendo. Entendo sim, Nerso! Mas num sobrô nada do dinheiro não?
- Óia, sobrá inté sobrô, mas é que eu tava devêno umas coisinha, na cidade, e acabei teno que pagá. O senhor sabe: eu num gosto de dá prejuízo pra ninguém; num pode deixá o nome da gente sujá. né, seo Warte?
- É... É verdade, Nerso. Bicho-calotêro!
- Ê home bão que é o senhor, seo Warte! Que Deus que conserve!
(Luciano Marques)
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