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SAUDADE
Fechar os olhos, ouvir o galo cantar e saber como a felicidade nessa vida é tão simples.
Como um sonho de saudade, fechei os olhos e sonhei estar novamente lá na antiga casa que vovó Julia viveu, até a vida lhe roubar os seus últimos suspiros, era uma casa simples no meio daquele Sertão de Deus, passava a cidade, pegava a estrada de terra que parecia não ter fim, passava a fazenda São José, atravessava a Capela de São Marcos do povoado Varjão seguia até as últimas terras, lá no meio da campina aparecia uma casinha pintada de rosa, quantas saudades desse pedaço de chão que mais parecia um paraíso do céu nessa terra.
Como é bom ter as lembranças da infância era uma outra vida, da casa simples pintada de rosa, daquelas terras, daquele Sertão. (mas como dói querer viver nem que for apenas um minuto aquele tempo, olhar nos olhos de vovó) Mas fecho os meus olhos, e a saudade me invade, as lágrimas de saudades caem, e novamente eu estou lá, vejo vovó Julia rezando o terço em alto e bom som no eco da sala, a hora do Angelis era hora sagrada, não se falava apenas se rezava, ela me dizia que era preciso ter fé nessa vida, e falava: "-Apois, sem fé minha filha ninguém se vive!" Eu só a ouvia, nunca aprendi rezar direito uma Ave-Maria, um Angelis era a coisa mais linda do mundo de se ouvir no fim da tarde, mas eu nunca aprendi a rezar direito, só a ter um pouco de fé.
E a cozinha era um lugar dos deuses, tinha o fogão a lenha, bebia água que se guardava na tigela de barro, era para ficar fresca, a cozinha tinha muitos segredos, a comida era inesquecível, tudo tão simples e tão bom, aquele silêncio diante da mesa, todos sentados calados, tudo que se cozinhava ali era gostoso, até o chá de capim Santo, o cheiro que se sentia saindo do fogão a lenha tudo era tão único, procuro aquele sabor que o tempo me roubou.
O alpendre era o lugar da casa que mais gostava, lá via o próprio vento passar, o silêncio da campina seca, a poeira atravessar, era o lugar da casa onde eu e vovó ficavamos juntas, sentadas ali em silêncio ouvindo o próprio silêncio uma da outra, vovó me falava coisas da vida como ninguém falava, e como ninguém até hoje me falou. Ela me ensinava com gestos e silêncios, me ensinou sem nunca ter usado um livro, onde está aquele silêncio, o vento que eu via passar, a poeira atravessar? Onde meu Deus ficou aquela verdadeira alegria, que de tão simples eu nem sabia, eu nem percebia, onde está aquele Sertão, aquele pedaço de chão, aquele tempo de vovó Julia, aquela campina, aquela casa cor de rosa, aquela Ave-Maria, aquela fé desmedida, aquela cozinha de fogão a lenha, aquela comida, aquele sabor que o tempo me roubou, aquele silêncio de dentro da alma, aquele pedaço de terra feito paraíso...
Mas como dói minha saudade meu DEUS!
(Texto Kelly Cristina Carvalho)
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