A doença da pressa
Luciano Marques (texto enviado pelo autor)
Quanto ao irreversível correr das horas, essa competição desenfreada de fazer sempre mais em menos tempo, cabe-nos saber: até quando suportaremos essa pressão cronometrada de acompanhar a velocidade tecnológica que nós mesmos criamos? Já não sabemos mais parar! Será que perdemos o nosso próprio controle remoto?
Por que corremos? Será que procuramos reaver o tempo perdido? Nessa tentativa insana, além de desperdiçar o próprio tempo, que é precioso, gastamos também uma energia valiosa, tentando recuperar o backup de algo que se grava apenas na memória: os momentos da vida.
Analisemos: quanto mais pressa, menos tempo; quanto menos tempo, mais pressa! À medida que nos preocupamos demasiadamente com a velocidade de nossas ações, quanto mais nos perdemos em horas mal vividas (corridas), mais a vida nos arrasta tempo a fora.
Na verdade, acostumamos a engolir a vida sem mastigá-la, sem degustar todos os seus sabores, e isso está nos adoecendo. Dessa forma, acreditamos que a cura para os nossos atrasos esteja na doença da pressa.
Na vida, essa curta viagem rumo ao
amanhã (desconhecido), somos todos induzidos e seduzidos pelo ter. Com isso, para financiarmos todos os sonhos de consumo, para alcançarmos nossos objetivos, somos conduzidos por agendas cheias, sem folgas, submetemo-nos ao controle de sistemas extremamente rígidos, eficazes para nos manter no foco daquilo que nos propomos e no cumprimento de todas as metas estabelecidas.
Assim vamos vivendo, ou melhor, vamos correndo, cada vez mais, centrados e iludidos pela glória do pódio, onde, inconscientemente, acreditamos que o vencedor seja o mais rápido. Nessa correria, miramos apenas a reta final (“os fins justificam os meios”), deixamos de observar tudo que fica pelo caminho e, pelo caminho percorrido ficam também as pessoas, aquelas que amamos e que esperam ansiosas pela nossa atenção.
O tempo, uma vez não mensurado, mal distribuído e não aproveitado, torna-se uma mortal máquina de envelhecer. Na ânsia de chegar rápido, nos esquecemos de observar as belezas espalhadas por onde passamos. À medida que correr torna-se um hábito, vamos perdendo o gosto pelas paragens, pela contemplação da natureza e principalmente pelos momentos felizes, cada vez mais raros, quase invisíveis e submersos aos nossos olhos rasos.
Lembremos ainda que a felicidade é fiel companheira, não abandona ninguém; entretanto, ansiosos como vivemos, correndo o tempo todo, será bem mais difícil de encontrá-la.
Agora, que tal parar um pouco e pensar?!
Texto publicado no jornal A Folha Regional em 27/03/2015.
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Valéria