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CONCURSO LITERÁRIO - HIPPIE

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Veja crônica de Vieira Vivo (org. do concurso) e mande a sua

Estradas e bandeiras

     A estrada recortava a mata em curvas e retas através do cerrado onde naquele dia o sol deitaria à sua frente. O recanto inteiro transpirava ao verão, impregnando o mundo de aromas. Em meio ao cheiro de cacau, capim e bosta de gado seus passos desciam a geografia dos mapas enquanto os olhos elevavam-se aos céus vasculhando a casa dos astros. Naquele entardecer, a cada passo, a abóbada multifacetava-se em nuvens e cores ao balanço dos ventos e da rotação do tempo. Todo o universo sempre em movimento. A planitude do relevo e o teto circular da terra formavam, como por encanto, rosados anéis salpicados por faiscantes raios da primeira estrela e pelo circular bailado da lua nova.


Esquecido estava dos homens e motores, que vão passando ao nos ver passar,*  que prosseguiu a caminhada e ao voltar a si, já anoitecera. A noite trouxe faróis e canseira, sono, trevas e mosquitos. Adentrou por um caminho um pouco além do asfalto e numa clareira estendeu o plástico e o lençol sobre a grama e coberto adormeceu cercado por milhares de ferrões, zumbidos e calombos de mordidas. O sono chegou pesado trazendo imagens velozes, sonhos convulsos e giratórias imagens.

     Adormecido pesadamente com a cabeça repousada sobre a terra vislumbrou ao longe, em meio aos sonhos, um galope febril de cascos se avolumando em sua direção. O pesadelo quase real o levou a um salto brusco ainda enrolado no lençol branco tendo à frente um enorme cavalo relinchando com fúria fitando-o. O animal suspendeu as patas e o corpo e avançou sobre ele. Num impulso pela sobrevivência o andarilho, ainda sonolento, saltou para trás enquanto um chicote serpenteou sobre sua cabeça e atingiu-lhe o ombro esquerdo. Acometido pela dor lancinante e pelo pânico, muito assustado, gritou que não era nada, que estava apenas dormindo ali e que o trotar dos cascos o assustara. Encontrava-se apoiado a um barranco, banhado em suor, atônito, dolorido e sonado.

     O cavaleiro passou ao largo esbravejando impropérios enquanto estalava o chicote com gestos extremamente nervosos. Falou em morte, mostrou a faca, esporeou o animal com força e desapareceu na noite. O rapaz com movimentos trôpegos recolheu os panos juntamente com o saco de viagem e, ainda, muito abalado subiu para o asfalto. O sereno misturado ao suor encharcavam-lhe, ainda mais, as roupas, porém um vento intenso e úmido o empurrava cada vez mais à frente em meio à incerteza e ao cansaço para bem longe dali.

     Horas mais tarde, próximo da meia-noite, ainda com dores no ombro,  mas-tigava um naco de pão seco, de cócoras, em frente a um posto de gasolina. Do meio da noite surgiu um outro maluco residente naquela cidade. Apresentaram-se, conversaram alguns minutos e, logo depois, este indicou um bom local para dormir em uma choupana abandonada na descida da estrada. Sorriu agradecendo e em seguida rumaram naquela direção. Ao atravessarem a pista falavam sobre distâncias, clima e sereno.

Crônica de Vieira Vivo do livro Agudas Crônicas
 

* Caetano Veloso


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