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Cláudio Feldman |
I
Escolho a música, e o volante de meu carro é um
pandeiro microfone... No momento em que dirijo, toco uma orquestra inteira no
volante do meu carro. Batuco, canto, danço, braço direito, braço esquerdo
erguidos tateando a enlaçar o vento - meu amado suposto. Olho de novo,
retrovisor interno, retrovisor externo direito, retrovisor externo esquerdo,
todo o cuidado é pouco... todo cuidado também é pouco... cantar... cantar é
mister batucar... Eclode uma alegria que pode não acabar nunca junto com essa
estrada que me conduz a... O volante erra o caminho, e eu não quero mudar a
música, meu carro todo é uma gigantesca caixa de som com direito a aplausos,
platéia participativa completíssima. Qualquer música me traz alegria imensa
infinda penetrante. Ouço uma buzina e outra, mas ninguém me incomoda mais.
Estou num show. Meu show.
II
Pra você é fácil – não é você quem vai ficar sem
você! Sou eu que vou ver você ausente, muito ausente de mim... Meu computador
inutilizado por estes dias em que não receberei suas mensagens... Viver sem
elas me é impossível. Sorte eu ter lembranças. Suas.
III
Sou vaidosa, gosto de banho, perfumes, uso creme no
corpo todo (um para cada parte – rosto, contorno dos olhos, lábios, colo,
seios, pernas, joelhos, cotovelos, pés) cada um com uma textura diferente,
conselho da dermatologista que, pra minha desgraça e maior angústia, é linda. Embora
mais velha que eu um ano, aparenta bem mais nova, quinze anos talvez. É.
Impossível sobreviver sem dermatologista. Acho que meu colo ainda é olhável,
seios palpáveis, sem silicone, meus seios ainda são bonitos. Cacete!!! Odeio
esse ainda que sou sempre obrigada a usar. Ainda... Claro! Acho que sou
comível, mas cadê homem pra crer nisso também? (Risos.Também de mim.) Homens
ausentes. Todos. Ninguém se apresenta.
IV
No restaurante, após uma imensamente esperada
(lipo)abdominoplastia. Angústia de fazer desjejum, de almoçar, de lanchar, de
jantar... Melhor jejuar. Por que descansar os talheres (principalmente, o garfo
e a colher) sobre a mesa ou nas bordas do prato? Por quê? Em restaurantes
finos, então, os garfos estão sempre cansados, porque descansam bastante já que
levados à boca assaz cansados (de quê?) enfim, descansam. São descansados.
Quisera ser anoréxica bulímica sei-lá-mais-como-de-magra ex-gorda... Ah! Nada
que o bisturi do Dr. Luciano não resolva... Comamos, que a vida é muito curta e
pesada (por que não esperar também?) e, depois, eu não creio mesmo em
reencarnação, logo, quando poderei degustar tamanhas delícias senão nesta mesma
vida atual? O jeito é ser gorda, rezar muito pra não engordar mais ainda e
agradecer genuflexa, mãos postas ao céu, por não explodir após tamanha gula.
V
“Parabéns a você...!” Que parabéns o quê! Odeio
fazer aniversário, máquina de somar a postos, mais um ano: 1955-2005: cinqüenta
anos de pura ansiedade. Tentei não chegar até aqui, mas... Viva! Felicidades.
Coma, como o bolo.
Obrigada.
- Hilda Curcio
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