INSTANTE
Para três queridas irmãs (Lourdes, Adélia e Gracinha), “encantadas” em tão curto espaço de tempo.
“Qualquer destino, por mais longo e complicado que
seja, consiste em um único
instante: o momento em que o homem sabe para sempre quem é”
(Jorge Luis Borges)
foto cláudia brino |
O instante: outrora–agora.
Imanência do
passado no presente: um presépio, pai,
trapiche, mar, mãe, pedaço de pão feito
em casa, outro menino/velho enrugado.
O homem saberá para
sempre quem é.
Quando (insisto)?
Foi ontem.
Ainda não
aconteceu?
Ou já estava escrito na
maternidade –
ou antes: na barriga da mãe.
No grupo escolar, naquele
beijo tão
longínquo.
A memória de
uma passeata em que o mundo seria mudado.
Uma enfermidade: ali ficou
enraizada –
tão bem colada na pele – a certeza da transitoriedade.
Apenas passamos: breve
sopro.
Mas testemunho: houve uma
celebração
– olhando aquele bar que já não existe
mais (o “Miramar”. E nesta manhã (que
pensei que não iria
viver), contemplo o Farol da Barra.
Tudo foi aterrado – resta um
pedaço de memória.
(Ela não é velharia inútil: pedaços de carne, olhos que sonharam com terras distantes, pés que pisaram neste quarto, bigodes, rostos, uma máquina de escrever,
álbuns de fotografias que
revisitamos em tardes chuvosas, e um guarda-chuva ao lado do guarda-roupa. E tanto mais.)
Outra memória:
aquela fuga na boca da noite, o exílio.
E continuo (até
quando?).
Já sei quem
sou/já não sei.
Soube sempre: outrora/agora.
(Salvador, maio de 2015)
Emanuel Medeiros Vieira
Comentários